Em Timor, os líderes entraram literalmente em retiro e só deverão sair dessa espécie de transe político depois do fim-de-semana, por imposição do presidente Ramos-Horta, que decidiu dar um prazo apertado a Alkatiri e Xanana – os dois grandes adversários saídos das eleições legislativas de 30 de Junho – para se entenderem quanto à formação do novo governo. A Fretilin e a aliança pós-eleitoral liderada pelo CNRT de Xanana Gusmão têm até segunda-feira para selarem um acordo e irem juntos para o poder ou, caso contrário, terão de se sujeitar ao livre arbítrio de Ramos-Horta.
O presidente decidiu que vai escolher no início da próxima semana quem irá estar à frente dos destinos do país nos próximos cinco anos e está determinado em dar posse ao futuro executivo a 1 de Agosto, qualquer que seja o desfecho das tentativas de diálogo entre os dois rivais.
Ramos-Horta diz estar “prudentemente optimista”, nesta altura, sobre a capacidade de entrosamento entre o partido vencedor das legislativas (Fretilin, com 29%) e o segundo partido mais votado (CNRT, com 24%), que assegurou a maioria parlamentar após uma coligação feita com o PD (Partido Democrático), a ASDT (Associação Social-Democrata de Timor) e o PSD (Partido Social-Democrata).
O presidente timorense tem sido o maior entusiasta de um governo de inclusão que junte no conselho de ministros as formações de Alkatiri e Xanana. “Essa é a leitura que eu faço do resultado destas eleições. E das mensagens que tenho recebido do povo, às centenas, não há uma única que não aponte para um governo de inclusão. Nenhuma outra solução é capaz de garantir a estabilidade do país”.
Líderes em reflexão
Na quinta-feira, todos os líderes dos partidos que ganharam lugares de deputado nas legislativas recolheram juntos ao convento de Dare, nos arredores de Díli, para um dia intenso de reflexão e confrontação, saindo de lá com tudo ainda em aberto. Segundo relatos feitos ao Expresso, a manhã foi dramática. Xanana Gusmão fez um discurso de quase uma hora com acusações sobre a má governação da Fretilin, terminando com a recusa de qualquer hipótese de acordo. Quando se calou, Alkatiri e Lu-Olo, o secretário-geral e o presidente do partido, responderam à letra. Foi preciso esperar pela tarde para o ambiente ficar mais descontraído, abrindo espaço para o CNRT de Xanana readmitir a possibilidade de um governo de inclusão.
No retiro de Dare, além da notória fragilidade das relações entre Alkatiri e Xanana, houve um outro sinal evidente sobre o mal-estar provocado pelos encontros promovidos pelo presidente: Mário Carrascalão, presidente do PSD, não compareceu. As operações de charme em torno do antigo governador de Timor parecem não ter resultado.
Se a aliança de Xanana avançar para um namoro de conveniência com a Fretilin, o mais provável é o PSD bater com a porta. E aí, num governo onde quase toda a gente estará dentro e quase ninguém estará fora, restará afinal alguém para cumprir uma das práticas mais saudáveis em democracia: oposição.
Micael Pereira
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