29/06/2007

Carta à "Srª Ministra da Educação"

"Um dia destes colocaram, no placar da Sala dos Professores, uma lista dos nossos nomes com a nova posição na Carreira Docente.
Fiquei a saber, Sr.ª Ministra, que para além de um novo escalão que inventou, sou, ao final de quinze anos de serviço, PROFESSORA.
Sim, a minha nova categoria, professora!
Que Querida! Obrigada!
E o que é que fui até agora?
Quando, no meu quinto ano de escolaridade, comecei a ter Educação Física, escolhi o meu futuro. Queria ser aquela professora, era aquilo que eu queria fazer o resto da minha vida… Ensinar a brincar, impor regras com jogos, fazer entender que quando vestimos o colete da mesma cor lutamos pelos mesmos objectivos, independentemente de sermos ou não amigos, ciganos, pretos, más companhias, bons ou maus alunos. Compreender que ganhar ou perder é secundário desde que nos tenhamos esforçado por dar o nosso melhor. Aplicar tudo isto na vida quotidiana…
Foi a suar que eu aprendi, tinha a certeza de que era assim que eu queria ensinar! Era nova, tinha sonhos...
O meu irmão, seis anos mais novo, fez o Mestrado e na folha de Agradecimentos da sua Tese escreve o facto de ter sido eu a encaminhá-lo para o ensino da Educação Física. Na altura fiquei orgulhosa! Agora, peço-te desculpa Mano, como me arrependo de te ter metido nisto, estou envergonhada!
Há catorze anos, enquanto, segundo a Senhora D. Lurdes Rodrigues, ainda não era professora, participava em visitas de estudo, promovia acampamentos, fazia questão de ter equipas a treinar aos fins-de-semana, entre muitas outras coisas. Os alunos respeitavam-me, os meus colegas admiravam-me, os pais consultavam-me. E eu era feliz… Saia de casa para trabalhar onde gostava, para fazer o que sempre sonhará, para ensinar como tinha aprendido!
Agora, Sr.ª Ministra, agora que sou PROFESSORA, que sou obrigada a cumprir 35 horas de trabalho, agora que não tenho tempo nem dinheiro para educar os meus filhos. Agora, porque a Senhora resolveu mudar as regras a meio (Coisa que não se faz, nem aos alunos crianças!), estou a adaptar-me, não tenho outro remédio: Entrego os meus filhos a trabalhadores revoltados na esperança que façam com eles o que eu tento fazer com os deles. Agora que me intitula professora eu não ensino a lançar ao cesto ou a rematar com precisão à baliza, não chego, sequer a vestir-lhes os coletes…
Passo aulas inteiras a tentar que formem fila ou uma roda, a ensinar que enquanto um “burro” mais velho fala os outros devem, pelo menos, nessa altura, estar calados. Passo o tempo útil de uma aula prática a mandar deitar as pastilhas elásticas fora (o que não deixa de ser prática) e a explicar-lhes que quando eu queria dizer deitar fora a pastilha não era para a cuspirem no chão do Pavilhão… E aqueles que se recusam a deita-la fora porque ainda não perdeu o sabor? (Coitados, afinal acabaram de gastar o dinheiro no bar que fica em frente à Escola para tirarem o cheiro do cigarro que o mesmo bar lhes vendeu e nunca ninguém lhes explicou o perigo que há ao mascar uma pastilha enquanto praticam exercício físico). E os que não tomam banho? E os que roubam ou agridem os colegas no balneário?
Falta disciplinar?
Desculpe, não marco!
O aluno faz a asneira, e eu é que sou castigada? Tenho que escrever a participação ao Director de Turma, tenho que reunir depois das aulas (E quem fica com os meus filhos?). Já percebeu a burocracia a que nos obriga? Já viu o tempo que demora a dar o castigo ao aluno? No seu tempo não lhe fez bem o estalo na hora certa?
Desculpe mas não me parece!
Pois eu agradeço todos os que levei!
Mas isto é apenas um desabafo, gosto de falar, discutir, argumentar com quem está no terreno e percebe, minimamente do que se fala, o que não é, com toda a certeza, o seu caso.
Bastava-lhe uma hora com o meu 5ºC… Uma hora! E eu não precisava de ter escrito tanto! E a minha Ministra (Não votei mas deram-ma… Como a médica de família, que detesto, mas que, também, me saiu na rifa e à qual devo estar agradecida porque há quem nem médico de família tenha – outro assunto) entendia porque não conseguirei trabalhar até aos 65 anos, porque é injusto o que ganho e o que congelou, porque pode sair a sexta e até a sétima versão do ECD que eu nunca fui nem serei tão boa professora como era antes de mo chamar!
Lamento profundamente a verdade!"


Carta escrita por uma professora de uma escola de Viana do Castelo, a qual prefiro não identificar por razões óbvias, não vá alguém se lembrar de lhe levantar um processo disciplinar e colocar a sua explêndida carreira em risco.

Laumalai

1 comentário:

cris disse...

Não se lembrariam... achas que sim? Não... não eram gajos para isso...era uma maldade....

filhos da mãe!!!!


bj